Trump e Lula: o telefonema, a nota oficial e o silêncio da Casa Branca

Um telefonema silencioso demais

Na manhã desta segunda-feira, 6 de outubro, o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, realizou — ou recebeu — um telefonema com o presidente dos Estados Unidos, Donald J. Trump. A chamada foi mantida em absoluto sigilo até ser confirmada por nota oficial da presidência brasileira. A mídia norte-americana, por sua vez, permaneceu em completo silêncio sobre o ocorrido.

Nenhuma linha nos principais veículos dos Estados Unidos: nem New York Times, Washington Post, The Hill, Politico, Wall Street Journal ou Fox News. A exceção foi a agência Reuters, que apenas republicou o conteúdo divulgado pela imprensa brasileira.

O que se sabe até agora é o que consta na nota oficial do governo Lula — e os comentários, reações e análises vieram com força.

A nota que não diz nada mas revela muito

A nota, redigida pelo núcleo de comunicação do Planalto, apresenta um tom amistoso e repleto de frases vagas. Afirma que os dois presidentes “relembraram a boa química” do último encontro na ONU e que há “impressão positiva daquele momento”.

No conteúdo formal, Lula teria solicitado a retirada da sobretaxa de 40% aplicada sobre produtos brasileiros e o fim das sanções contra autoridades do governo, inclusive aquelas decorrentes da Lei Magnitsky. Trump, por sua vez, designou o Secretário de Estado  Marco Rubio para conduzir as negociações com representantes do governo Lula: Geraldo Alckmin, Mauro Vieira e Fernando Haddad.

Mas o que parecia uma abertura diplomática revela, na verdade, uma jogada de contenção por parte dos Estados Unidos — e uma sinalização política forte da campanha de Trump.

Marco Rubio: a pior notícia para o Planalto

A escolha de Rubio para liderar o diálogo não foi um gesto de gentileza. Pelo contrário. Trata-se de um dos principais formuladores da política de sanções americanas contra regimes autoritários na América Latina. Foi peça central nas ações contra Cuba, Venezuela e, mais recentemente, contra o Brasil.

A indicação de Rubio para tratar com o governo Lula mostra que não há qualquer intenção de flexibilização. Pelo contrário: reforça-se o cerco. O secretário é conhecido por sua postura dura contra governos que flertam com regimes comunistas ou autoritários. E ele conhece bem os nomes do tabuleiro latino-americano.

Entre os seus alvos históricos estão justamente os regimes e figuras aos quais Lula tem prestado apoio: Cuba, Maduro, Putin e o núcleo dos BRICS. Além disso, Rubio já declarou publicamente que trabalharia para desmantelar o sistema de censura judicial brasileiro. Não é apenas um interlocutor. É uma advertência.

“Química” e “amizade” em nota — mas não na prática

A impressão deixada pela nota oficial é de que foi escrita mais para consumo interno do que para relatar uma real reaproximação. A tentativa parece ser a de mostrar à base e ao mercado que o presidente brasileiro “fez a sua parte” e “busca diálogo”. Mas o resultado prático é nulo.

A ausência de qualquer posicionamento público por parte de Trump reforça a ideia de que não houve reciprocidade. Nem mesmo uma frase atribuída diretamente ao ex-presidente americano aparece na nota. E, enquanto isso, membros do governo brasileiro evitam comentar a reunião fora do texto oficial.

É o tipo de gesto que, ao invés de comunicar força, evidencia isolamento. Se houve uma tentativa de propaganda, ela falhou em convencer até mesmo os mercados, que seguiram indiferentes após a divulgação do comunicado.

Um movimento de Lula e não de Trump

Embora a nota afirme que Lula “recebeu uma ligação”, o silêncio total da mídia americana sugere o oposto. Não há qualquer sinal de que o contato partiu de Trump. Se tivesse partido dos EUA, haveria cobertura, reação ou ao menos um registro protocolar. Nada disso aconteceu.

A reunião parece ter sido solicitada por Lula, com o objetivo de tentar abrir canais de negociação e amenizar as pressões que crescem sobre seu governo. Mas, ao final, o que se viu foi a designação de um nome amplamente hostil à diplomacia petista. E uma clara mensagem de que o jogo não será facilitado.

Celso Amorim, um dos principais articuladores do governo Lula em temas internacionais, participou do encontro. Figura controversa aos olhos de Washington, é defensor da política anti-Israel, apoiador do regime de Putin e entusiasta de uma integração sul-americana nos moldes bolivarianos. Sua presença na reunião apenas reforça o abismo que separa o discurso oficial da possibilidade real de aproximação com os Estados Unidos sob um eventual novo governo Trump.

Uma tentativa de reverter o isolamento

O governo Lula tenta, a todo custo, se reposicionar no cenário internacional. As sanções americanas, o aumento de tarifas e o congelamento de relações institucionais de alto nível deixaram o Brasil em posição delicada. A ligação a Trump parece ser um esforço nesse sentido — mas mal executado e pouco convincente.

Ao apresentar uma nota vaga, recheada de chavões diplomáticos, mas desprovida de conteúdo concreto, o Planalto tentou transmitir uma imagem de normalização. No entanto, a realidade geopolítica é outra: os Estados Unidos estão endurecendo com a América Latina, especialmente com governos que apoiam regimes autoritários.

A escolha de Rubio para interlocução é simbólica. Onde o Planalto esperava colher alívio, encontrou uma muralha. O diálogo continuará — mas sob os termos americanos. E com os olhos atentos de quem vê no Brasil um epicentro de instabilidade.

Conclusão: a nota é uma empada de vento

A nota oficial não trouxe nenhum avanço real. Nenhuma proposta concreta, nenhuma sinalização americana de flexibilização. Apenas frases de efeito e convites simbólicos, como a presença de Trump na COP30 em Belém — algo completamente fora do radar diplomático de Washington.

O governo brasileiro tentou inflar um gesto simbólico como se fosse um acordo histórico. Mas os fatos são teimosos. E o silêncio dos Estados Unidos diz mais do que qualquer frase escrita por assessores de imprensa. No fim das contas, o governo brasileiro falou sozinho — e negociará com quem menos gostaria de enfrentar.

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